Memorial dos Impotentes

No alegre cumear dos montes
Lá onde as oliveiras tremem
Andava um gavião de asas brancas
Parecia já saber que me perseguem
Ó areal, ó mar Atlântico
Ó vã lazeira má tristura
A obra há-de ser bem assentada
Na terra da firmeza e da loucura

Li pela manhã
Os números no jornal
Nada que impressione
É-me tudo igual
As cartas do futuro
Dêem morte ou glória
Pró bicho da era moderna
São só mais uma história

Tomai farelos e gracejos
Cinistas arrilhai os dentes
É só pôr o meu nome aí lacrado
No memorial dos impotentes

Ó Leonor de Távora
Que tal a guilhotina?
Diziam que a si não lhe assentava
Por ser bela a menina
São sete os cavaleiros
Uma só missão
Dar água aos eucaliptos de Catraia do Sortelhão

Roubas-me a vontade
Dás cabo do meu vizinho
Em toda a parte és pedaço de mau caminho
Nota, um dia destes tens à porta
Quais quinhentos um milhão

Levava-te às Caldas
Só que ando a trabalhar
Passa aí na moshe
Do roque popular

Podem cancelar na Clínica de Oiã
Não morremos hoje nem casamos amanhã


Informações:

 Disponível no álbum Roque Popular (2012).
Letra e Música de Jorge Cruz. 

Produzido por Jorge Cruz.
Misturado por Eduardo Vinhas. 
Masterizado por Andy VanDette.

Curiosidades:
 Os versos "As cartas do futuro/ Dêem morte ou glória/ Pró bicho da era moderna/ São só mais uma história" são uma referência ao refrão de Death or Glory dos The Clash.

 A marquesa D. Leonor de Távora foi uma das vítimas executadas (decapitada, neste caso) durante o Processo dos Távoras, um escândalo político português do século XVIII.

 Os versos "São sete os cavaleiros/ Uma só missão/ Dar água aos eucaliptos de Catraia do Sortelhão" são uma referência à eucaliptização, a plantação desordenada de eucaliptos que ameaçam a floresta natural e as árvores autóctones portuguesas.

 Clínica de Oiã era notoriamente conhecida por fazer interrupção voluntária da gravidez medicamente assistida várias décadas antes da legalização do aborto em Portugal em 2007.

Comentários:
• «Um dos temas mais complexos do catálogo do projecto, estes 5:39 fecham brilhantemente o álbum. Construída sob várias secções, cada uma delas tem o poder de deixar o ouvinte cada vez mais agarrado à música (ah, o baixo!!!). Arrisco dizer que “Memorial dos Impotentes” é a “Shine On You Crazy Diamond”, a “March Of The Black Queen” ou a “I Am The Walrus” dos Diabo na Cruz. É a sua complexidade que a transforma na mais impressionante criação de Jorge Cruz e companhia! Que forma mais épica de fechar um Roque Popular que merece um lugar entre os melhores álbuns do ano!» Work-Song